Aquela carta era explícita. Eu, Demetria Lovato, não tinha conseguido a bolsa na Universidade de Chicago. Eu sabia que seria difícil entrar na renomeada universidade privada, mas eu realmente tinha esperanças de que era capaz. Era para ser o meu futuro e agora ali estava eu, sentada no meio do stock de garrafas alcoólicas e chorando como um bebé. Eu realmente devia ter aberto aquela carta em outro lugar.
— Então boneca? Porquê
esse choro em cima das grades de tequila? Existem melhores formas de afogar as
mágoas, você sabe disso. — Ouvi Steve perguntar. Levantei o rosto e encarei-o
sem me importar com a maquilhagem deslavada.
— Você pode não ser o
meu chefe por cinco minutos e ser o meu melhor amigo? — Perguntei respirando
fundo em seguida.
— Claro que sim. Vem cá
princesa. — Gesticulou com as mãos. Travei o bico de choro e corri para
abraçá-lo.
— Eu não consegui Steve.
Eu não consegui a bolsa. — Disse-lhe enquanto voltava a chorar no seu ombro.
Senti as grandes mãos, surpreendentemente delicadas em meu cabelo e funguei
enquanto ele me fazia cafuné.
— Princesa, não fique
assim. Não é o fim do mundo Demetria. Pode tentar novamente, não pode? —
Perguntou segurando-me pelos ombros e afastando-me o suficiente para observar o
meu rosto.
— Não este ano. — Disse
limpando as lágrimas. — Se não consegui agora, vai ser impossível no ano que
vêm. Ainda menos oportunidades vão dar por ter perdido um ano.
— Não é sua culpa Demi.
Não há mais nada que possa fazer? Não há outra universidade que possa ir?
— Não Steve. Uma coisa
é eu me matar a trabalhar para juntar o dinheiro para a universidade daqui,
outra coisa é precisar de juntar muito mais para me estabelecer lá fora. Aqui
eu tenho casa, amigos e tudo o que preciso. Não fora da cidade. — Suspirei
limpando as lágrimas. Soltei uma risada incrédula e encarei o teto. — Que
estúpida que eu sou. — Xinguei nervosa. — Devia ter criado um plano
alternativo. Minha mãe sempre me disse…
— Você não é a Elisa, Demi.
— Cortou seriamente. Olhei-o e respirei fundo com uma renovada vontade de
chorar. — Eu conheço a sua mãe muito bem para saber que ela…
— Vai ficar desiludida.
Para não dizer pior. — Completei. Steve riu e eu tentei achar a graça.
— Não princesa. Sua mãe
acredita que as mulheres irão governar o mundo e tem todo o direito de defender
os seus ideais. Ela só não pode te arrastar para esse meio. Você ao menos
queria ir para essa universidade de riquinhos? Essa não é você, Demetria.
— Steve, a Universidade
de Chicago é uma das melhores do país. É claro que eu iria querer. — Retruquei
óbvia.
— Você ou sua mãe? — Perguntou
erguendo uma sobrancelha. Olhei-o e bufei cansada, sentando-me novamente nas
grades de tequila.
— Eu queria fazer isto
por mim Steve. Sim, é claro que também queria deixar a mamãe orgulhosa, mas eu
queria fazer principalmente por mim. Era o meu principal objetivo e sem ele não
consigo fazer mais nada.
— Me escute pequena. —
Pediu segurando as minhas mãos e me fazendo olhar nos olhos incrivelmente azuis.
— Você não é uma desistente. Desde que eu me lembro de você pirralha, fazendo a
sua mãe quase ter um ataque de coração por ter trepado a árvore do jardim da
sua casa, que eu sei que você não é uma desistente. — Me lembrou. Sorri com a
lembrança. Já nessa altura eu acabava com a paciência de qualquer um. — Você
tem bravura dentro de você, tem humildade e o mais importante de tudo, é
teimosa quando acha que deve ser. Não deixe que um não lhe feche todas as
portas. Você não limpou copos e mais copos aqui no bar por nada. Não pode
desistir agora. Se este ano lhe fechou uma porta, o ano que vem vai-lhe abrir
duas. A vida me ensinou isso.
— Steve temos um
problema! — Exclamou Jack entrando no armazém. — Kim ligou avisando que não
está se sentindo bem e que não poderá vir esta noite.
— O quê? E ela só liga
avisando a esta hora? Quem é que vai fazer o turno dela agora? — Perguntou
exasperado. Suspirei e pela primeira vez resolvi fazer algo que Steve nunca
exigiu que eu fizesse.
— Eu cubro o turno
dela. — Falei olhando para Jack. Ele assentiu e voltou para a reposição no
balcão.
— Você tem a certeza
disso Demi? — Perguntou Steve.
— Sim, tenho. Se a Kim
consegue eu também vou conseguir. Além disso, tenho que treinar daqui para a
frente.
— Porquê? — Perguntou
confuso.
— Preciso arrumar
alguma forma de me manter ocupada durante doze meses. Acho que adicionar um
novo turno é um bom começo.
— Mas você nunca fez o
turno de sábado à noite. — Falou como se isso fosse uma desculpa para não
fazê-lo. — Além disso, sua mãe vai cortar as minhas bolas se eu deixar você
fazer isso. — Disse ao fazer uma careta. Ri pelo linguajar e arrumei um pedaço
do cabelo castanho atrás da orelha dele. Steve sempre seria Steve.
— Primeiro, é só um
turno. Segundo, eu não me importo de fazer esse favor para Kimberly. E
terceiro, mamãe não vai cortar as suas bolas pelo menos por mais um mês. Ela
está em negociações com os japoneses e dessa vez vai demorar mais tempo. —
Falei com um sorriso malicioso. Steve tentou fazer cara séria, mas eu só ri.
— Muito engraçado. —
Riu ironicamente, ficando mais sério em seguida. — É sério Demi. Se eu permitir
uma coisa destas, será apenas por essa noite. — Avisou. — Ah, e você não pode
fugir da sua mãe para sempre.
— Quem disse que eu
estou fugindo? — Perguntei alarmada. É claro que eu estou fugindo. Quanto mais
tarde eu contar as “novidades” para mamãe, melhor.
— Eu conheço você. —
Lembrou.
— Eu sei. — Suspirei
derrotada. — O meu verdadeiro problema é que se eu for para casa no final do
meu turno não vou pensar em mais nada além desta carta e vou dar em louca. Ao
menos aqui posso me distrair e vou ser útil em alguma coisa. Não me custa nada
fazer isso. — Afirmei com total certeza. Eu me conhecia bem de mais. Até no
trabalho eu iria pensar naquela maldita carta.
— Certo. — Concordou
por fim. — Sendo assim você pode fazer o turno da Kim. Mas apenas por hoje. —
Acrescentou. — Parece que os lobos saem há rua nos sábados à noite, por isso
não se admire se encontrar uns quantos atrevidos. — Alertou. — Jack vai ficar
para te ajudar, mas você está inteiramente autorizada a quebrar uns quantos
narizes se precisar. — Falou piscando. Ele sabia que eu sabia me cuidar, mas
não consegui evitar de rir com a ideia.
Depois de encerrada a
conversa voltei a limpar e a arrumar os copos nas prateleiras. Ao olhar o
ambiente rústico do bar acabei lembrando de como entrei no Bourbon pela
primeira vez. Sim, Bourbon como o whisky.
Steve William é um
antigo amigo de família e é quase como o pai que eu nunca tive. Apesar de ele
não ter a consciência de que tenho essa noção, eu sei que ele tem uma queda
pela minha mãe. Ele sempre se mostrou interessado de mais e conforme eu fui
crescendo, fui entendendo o porquê dele fazer quase tudo o que a mamãe pedia.
Não que fosse algo ruim. Eu amo o Steve. Apenas acho que a mamãe nunca serviria
para ele. Eles são diferentes de mais. Minha mãe é complicada de mais.
Apesar de todas as
coisas inacabadas entre eles, foi graças a isso que ele esteve presente na
minha vida toda. Ele simplesmente estava lá quando deveria estar e não podia
ser mais perfeito. De alguma forma, era ele a minha figura de pai. Solteiro e
sem filhos, Steve meio que me apadrinhou. E com Steve veio Zachary Miles, seu
melhor amigo, e o filho do mesmo, Jackson, o moço que trabalha comigo aqui no
bar.
Bourbon é o nome escrito
a néon azul lá fora. Quando completei dezasseis anos Steve me deu um lugar para
trabalhar aqui no bar. Dono do mesmo e já com quarenta anos, apesar de novo, já
se torna difícil para ele aguentar o ritmo intenso das noites. Ele precisava de
uma ajuda nem que fosse apenas umas horas por semana. Comigo ajudando no
serviço durante as tardes depois da escola, ele passou a cuidar apenas da
gerência e da contabilidade. Era a minha responsabilidade ajudar na limpeza e
na reposição do stock para a noite seguinte. Foi assim por uns três meses até
que eu ganhei o meu primeiro turno. Oficial.
Hoje, a dois meses de
completar dezoito anos, sou uma trabalhadora com contrato e com todos os
direitos de qualquer trabalhadora-estudante. Agora, com o dinheiro preciso na
conta bancária e com a recusa da universidade nas mãos, eu simplesmente não sei
o que fazer. Sei que Steve me apoiará e acredito que mamãe, apesar de desiludida,
acabará por aceitar. Não será esse o problema. Não. O problema é apenas uma
questão.
O que eu farei durante os
próximos doze meses?
Muitos turnos de sábado
à noite? Bem provável.
Espero que tenham gostado do capítulo, os comentários foram respondidos e amanhã tem mais.xoxo
Posta+, to adorando! Bjos
ResponderEliminarPostei mais um :)
Eliminaradooorei
ResponderEliminarposta mais.
por favor :D
bjss
Postei mais um capítulo. Fico feliz que esteja gostando :)
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